UltraStellar é a última coleção de mobiliário que Zaha Hadid criou antes de sofrer um ataque cardíaco fatal, em março deste ano, aos 65 anos. As peças foram finalizadas pelo escritório Zaha Hadid Architects e fazem referência aos móveis das décadas de 50 e 60, com a utilização de madeira.
A escolha do material, aliás, é algo bastante incomum nos móveis desenhados pela arquiteta em vida – com inúmeros projetos em acrílico. Contudo, a coleção exposta na galeria David Gill, em Londres (Inglaterra), marca também o próximo capítulo do escritório – agora sob o comando de Patrik Schumacher.
O profissional, que trabalhou estreitamente com Hadid em UltraStellar e era considerado seu braço direito, vai liderar a direção criativa dos arquitetos e demais membros do estúdio. Nascido em Bonn (Alemanha), Schumacher trabalhou com Zaha Hadid em seu escritório, em Londres (Inglaterra), a partir de 1988 até sua morte no início deste ano.
Coleção UltraStellar de Zaha Hadid
É Patrik Schumacher que revela a inspiração para a coleção e escolha pela madeira, ainda que todas as peças destaquem curvas suaves – característica da assinatura de Zaha Hadid em suas obras, incluindo a arquitetura. “Tentamos obter, ao mesmo tempo, leveza e robustez, e percebemos que a madeira pode ser muito forte e muito leve”.
“A ideia de utilizar madeiras também foi influenciada por uma exposição de trabalhos de designers brasileiros a partir dos anos 50 e 60, e de um olhar para o interior e produtos do período Art Nouveau e seus usos orgânicos”, detalhou o arquiteto durante o evento de inauguração da exposição.
A inclusão de outros materiais, como vidro, couro, prata e alumínio, também foi alvo de comentários. “Ainda que não sejam materiais tradicionais nos anos 50 e 60, eles são bonitos e fornecem um potencial de luz, linhas orgânicas e formas para a coleção”.
Peças e mobiliário assinado
A madeira de nogueira (Walnut) foi escolhida por sua cor e resistência, sendo curvada em linhas fluídas e sinuosas nas peças criadas. A mesa de centro, por exemplo, é composta por quatro partes iguais e cada uma delas tem uma ondulação de profundidade no seu centro. A proposta era criar uma sensação de leveza e uma conexão visual com a estrutura e pernas.
Já a grande mesa de jantar, a maior peça da coleção, apresenta forma oval e um olho de vidro no centro. Descrita por Patrik Schumacher como “estruturalmente ambiciosa”, a mesa valoriza formas irregulares e pernas grossas que suportam a bancada oval. A disposição das pernas também leva em conta a oferta de espaço para quem está à mesa.
UltraStellar também revela um olhar apurado para o acabamento. A cadeira de jantar apresenta braços arqueados e pernas afuniladas, com couro revestindo toda a parte interna e se estendendo até a parte inferior dos pés. O modelo também foi adaptado para uma cadeira dupla, ligadas por braços torcidos. “As belas superfícies vão continuamente torcendo e movendo-se, e estão sempre com dupla curvatura”, explica Schumacher. “Por isso são muito orgânicas”.
Liquid Glacial e Candelabro
Além do mobiliário em madeira, a coleção de Zaha Hadid inclui três novas peças na linha “Liquid Glacial” – originalmente apresentada em 2012 na Galeria David Gill e que se expandiu novamente em 2015. São dois aparadores e uma tigela em acrílico polido. A tigela também ganhou uma versão em prata. O desenho das peças captura o momento em que uma pedra cai na água.
Outra peça central da coleção, esta produzida em alumínio e vidro, é o candelabro Lisse – apresentado como protótipo em 2014 e finalizado neste ano. A peça de grandes proporções ilustra uma interação cuidadosa entre sombra e luz, com uma rede complexa de linhas, apoiando pequenos aglomerados de luzes. Há ainda quatro linhas que se estendem para fora da armação estrutural.
Zaha Hadid Architects (ZHA)
Em entrevista à veículos de comunicação da Inglaterra, Patrick Schumacher (foto) disse acreditar que a empresa ainda tem um futuro e pode continuar a crescer. “Nossa equipe ainda é muito jovem e temos uma grande quantidade de energia e poder para nos mover adiante”, diz. “Eu acredito que o tipo de organização que somos é sem precedentes e ainda está a evoluir”.
No momento da morte de Zaha Hadid, 36 projetos estavam em fase de desenvolvimento em 21 países, incluindo o novo terminal do Aeroporto de Pequim (foto), na China, e um estádio para a Copa do Mundo de 2022 da FIFA, no Qatar.
Para o segmento de móveis e design de interiores, o profissional lembra que o ZHA dispõe de seções específicas e que esse mercado está no hall de ações. “Todo mundo gosta de fazer um pouco de móveis, porque é um processo mais rápido do que a arquitetura, e para nós é divertido criar. Nós temos arquitetos envolvidos em coleções, mas também temos um departamento de design de interiores, que inclui mobiliário e design de produto”.
Design de mobiliário e produto x projeto arquitetônico
Já para explicar as semelhanças e diferenças entre a abordagem da ZHA para o design de mobiliário e produto x projeto arquitetônico, Schumacher é enfático: “Design é universal, e filosofias específicas geralmente migram sobre todas as disciplinas de design”. Como exemplo, ele cita os movimentos Modernistas e Bauhaus, que inspiram arquitetura, interiores, mobiliário, produtos e texturas.
Ainda assim, o arquiteto lembra que a complexidade de trabalhos de espaços urbanos e arquitetura em relação a interiores e mobiliário são diferentes. “Em geral, você precisa de tempo para síntese. Em um interior, onde você tem móveis e objetos na sua frente, próximos ao corpo e você pode tocá-los, há elementos mais ergonômicos e táteis envolvidos do que em relação à arquitetura. É por isso que couro e zonas almofadadas tornam-se aspectos que devemos levar em considerações”.
Patrick Schumacher acrescenta que em projetos de interiores e mobiliário é preciso tomar cuidado com outros detalhes. “Às vezes, temos que considerar até determinados aromas que emanam da madeira”.