“Design não é mais sobre como fazer uma mesa”, acredita Patricia Urquiola. “É mais sobre a forma como os espaços evoluem, como eles se conectam ao longo do tempo”. Um dos grandes nomes do mobiliário e arquitetura contemporânea, a profissional revela como as mudanças de estilos de vida impactam seu trabalho.
Nascida na Espanha, mas radicada na Itália – onde dirige seu estúdio de design e arquitetura em Milão –, Patricia Urquiola diz ser difícil usar a palavra “tendência” para falar desse processo. “Esta palavra é mais lógica em uma abordagem de marketing ou no jornalismo”. “O argumento importante em nosso trabalho é: nós compreendemos que estamos evoluindo mais e mais em um tipo de sociabilidade da rede?”.
Urquiola considera que isso envolve diferentes níveis de mobilidade. Em sua análise, explica, não é apenas sobre os movimentos que fazemos todos os dias na cidade, para a nossa casa, nosso estúdio, um espaço público, um hotel, ou ainda sobre o trabalho que realizamos durante o nosso trajeto para esses lugares. “Todas essas mobilidades físicas estão conectadas à rede digital, o que cria outro tipo de mobilidade. Todos esses aspectos estão ligados”.
“Temos que compreender e avaliar o conceito de vida privada em nossa casa, nos lugares onde vivemos e trabalhamos”.
Para fechar essa “equação”, Patricia considera a existência de uma ‘paisagem’ entre todos esses lugares: casa, trabalho e espaços públicos. “Em alguns momentos você está em uma esfera mais pública, em outros em uma mais privada. Mas isso pode acontecer no lobby de um hotel ou em seu estúdio, em um aeroporto ou em muitos outros lugares”.
Abaixo, em sequência, design de interiores assinado por Patricia Urquiola para o Mate Hotel Giulia, em Milão (Itália). Na última foto, interior do Mandarin Oriental Hotel, em Barcelona (Espanha).
Evolução do morar e do projetar
A partir dessas perspectivas, Patricia Urquiola admite que muitas coisas se envolvem e é realmente complexo fazer essa análise. “Mais e mais pessoas sabem como escolher os elementos que são importantes para elas”.
“Vivemos numa sociedade complexa. Mas você tem que encontrar as conexões certas e conectar momentos com pessoas e ideias que são boas para você. E temos que nos mover dentro desta sociedade em rede de uma maneira melhor”.
Outro ponto de vista interessante da designer e arquiteta espanhola diz respeito ao projeto de ambientes e desenho de móveis. Afinal, cada espaço pode ser usado de várias maneiras dentro de um mesmo dia. “Não é mais uma questão de fazer uma cadeira ou uma mesa, é mais sobre a construção de espaços e como os espaços sobrevivem ao tempo. O aspecto do tempo tornou-se um elemento muito importante e dá vida a qualquer tipo de formação arquitetônica ou produto”.
“Estamos no início de um período que pede projetos complexos, o que é muito interessante”.
Móveis e projetos de Patricia Urquiola
Beam Sofa System é um sistema de assentos que inclui três sofás, mas que podem ser usados individualmente. Modular, as peças se dividem entre unidades de dois ou três lugares com apoio de braço esquerdo ou direito, unidades centrais de dois lugares, unidades de canto com espreguiçadeira, além de mesas de centro ou lateral.
Cada elemento está sobre uma base “viga”: geométrica, formal e com forte impacto estético. É esta base o núcleo funcional do sistema e que permite criar diferentes configurações. A proposta, pontua a autora, centra-se na praticidade e no conforto, juntamente com a atenção aos detalhes.
A Poltrona Gender (Gênero) é outra peça assinada por Patricia Urquiola. Seu nome é resultado da identidade mutável baseada em combinações de materiais e cores, com uma ampla gama de aplicações e usos.
De curvas sinuosas e com sete diferentes combinações de cores, além de inclinação de 12º no seu espaldar, a poltrona pode assumir contornos masculinos ou femininos. “Há uma mistura de gêneros na sociedade, não só mulheres e homens, e temos que abordar essas situações de uma maneira melhor”, salienta Urquiola.
Arquitetura + design + Cassina
Sobre o trabalho como arquiteta e designer, Patricia Urquiola é enfática na divisão das disciplinas. “Para mim, ambas são fantásticas e tem sido bastante natural saltar de um para o outro. Mas são duas profissionais diferentes”. Ela lembra que durante seus estudos na Itália, havia uma espécie de fusão entre eles. “Mas há uma diferença no processo. Você se concentra de maneiras diferentes, resolve outros tipos de problemas e os diálogos são outros”. Seu estúdio foi inaugurado em 2001, trabalhando em design de produto, arquitetura e instalações.
Atualmente, aos 56 anos, Patricia também acumula o cargo de diretora de arte da Cassina – uma terceira via profissional e que inclui a área de negócios. “Por um longo tempo, ao pensar em um passo como este, eu hesitei. Pensei que poderia perder minha liberdade. Mas estou muito orgulhosa e feliz do que está acontecendo agora. É uma relação verdadeiramente dupla, algo muito generoso e aberto”.
Sobre o viés comercial, a designer espanhola pondera que é preciso lidar com tudo, mas o trabalho vai além. “É mais sobre a compreensão do nível cultural da empresa; no momento e como ela poderia se desenvolver através de pequenos movimentos. É importante que você possa fazer um monte de coisas grandes, movendo-se pouco a pouco”.
Patricia acrescenta: “É um processo contínuo; verificar se vemos um problema corretamente, entender quais são os obstáculos e qual deve ser o caminho. Com muito entusiasmo e senso crítico. Isso leva não apenas a alguns processos de design específicos, mas a um processo maior que é muito fascinante”.
Design contemporâneo
A italiana Cassina foi fundada em 1927 e desde então tem trabalhado lado a lado com alguns dos melhores designers do mundo. Em 1964, a marca assumiu a produção das obras licenciadas de Le Corbusier e seus colaboradores. A licença exclusiva e mundial da Fundação Le Corbusier perdura até hoje.
O time que assina as peças e coleções da marca é extenso. Há nomes como Philippe Starck, Bertjan Pot, Ron Gilad, Charlotte Perriand, Mario Bellini, Piero Lissoni, Luca Nichetto, Konstantin Grcic, Ora Ito e Zaha Hadid, que faleceu em 2016 após um ataque cardíaco. Também há uma coleção com maestros do passado e edições limitadas exclusivas. No Brasil, a marca está presente com loja em São Paulo.