Uma associação, uma fábrica de móveis e um programa educacional – tudo em um projeto que visa a produção de mobiliário de design exclusivo e sustentável com refugiados instalados na Alemanha. Isto é Cucula – palavra de origem africana, da língua Haúça, que significa: “fazer algo junto”.
A iniciativa, que está no centro de várias discussões e reportagens do Habitus Brasil sobre comportamento, tendências, produção e consumo, demonstra a inter-relação dessas ações envolvendo a fabricação de móveis e os novos tempos em que estamos inseridos.
Cucula também é a única firma autorizada a produzir e vender mobiliário com desenhos do designer italiano Enzo Mari – profissional destacado, professor e autor do livro ‘Autoprogettazione’ (ou “design próprio”), que aborda a construção de mobiliário DIY (Do It Yourself, do inglês faça você mesmo) por meio de 19 desenhos.
O livro, lançado em 1974, é considerado um marco importante na história do design de produto no mundo, e a obra da Enzo Mari apresenta uma oportunidade para os refugiados de construir móveis sustentáveis, bonitos e de alta qualidade, com ferramentas simples e pouco know-how quando se trata de carpintaria / marcenaria.
“O design tem algo a ver com utopia” – Enzo Mari
CUCULA TRABALHA COM, E NÃO PARA OS REFUGIADOS
Cucula é um misto de inclusão social, emancipação e acesso à educação para vítimas de cenários de desastres globais. Ao trabalhar na oficina, os refugiados provenientes de Níger e Mali, na África Ocidental, adquirem noções básicas de artesanato e construção de móveis, e a receita da venda dos produtos financia a sua subsistência e educação.
“Sabemos da complexidade social que o assunto representa para a Europa e o mundo, mas Cucula quer estabelecer uma cultura de boas-vindas, que ajude refugiados a romper com a visão de vítimas e ao mesmo tempo seja eficiente para criar perspectivas para uma nova vida”, explica a co-fundadora Corinna Sy. Sebastian Däschl, Jessy Medernach e Barbara Meyer fecham o quadro de fundadores.
O primeiro lote de móveis vendidos se deu via financiamento coletivo (crowdfunding) na internet, e os pedaços de madeira de cor, aplicados em algumas peças, são provenientes dos destroços dos navios dos refugiados, coletados em Lampedusa, na Itália.
A iniciativa do mestre Enzo Mari
Enzo Mari, que concedeu os direitos autorais sobre suas peças, sugere a democratização do design, provocando uma identificação mais forte com a nossa própria mobília, além de promover um processo de aprendizagem e reflexão.
“Pegamos o conceito de Enzo Mari e colocamos em outro contexto. Até então, ninguém podia produzir esses móveis e vender, mas eles eram muito conhecidos dos livros de design, e a união de um designer bem conhecido a uma causa social, permitiu desenvolver seus talentos e devolver o futuro em suas próprias mãos”, ressalta Corrina.
Ela acrescenta que no primeiro contato com Ali Maiga Nouhou, Djáè Dabo, Malik Agachi, Moussa Usuman e Saidou Moussa, em um campo de refugiados em Berlim, “eles disseram que não precisavam de móveis, precisavam de trabalho e dinheiro”. Hoje, todos trabalham no Cucula, com suporte de moradia e saúde.
“Eu quero criar modelos para uma sociedade diferente”
Reconhecimento internacional
O projeto, nascido em 2014, conta com outros colaboradores e embaixadores, e seu reconhecimento é crescente. Recentemente, Cucula foi agraciado com o prêmio IF Public Value Award 2016, em Munique (Alemanha) – um dos mais conceituados e completos prêmios de design do setor. O Prêmio iF Valor Público foi apresentado este ano pela primeira vez como parte do iF Design Awards.
Este é um reconhecimento público do valor social para projetos que encontrem soluções criativas para problemas locais, regionais e globais da atualidade, ou seja, para o valor público e de uso que uma empresa, instituição ou organização adiciona à qualidade ou melhoria da vida.
Nesse sentido, vale conferir a reportagem sobre o Desafio Global de Design promovido por IKEA Foundation, ACNUR – Agência da ONU para Refugiados e a WDCD – plataforma de design, de origem holandesa. Conheça o Projeto Cucula: Fazer algo junto.