Empresas investem recursos para criar, gerenciar e promover marcas, produtos e serviços. Para isso, contam com seus colaboradores, consultorias externas e ferramentas de design para cada projeto. Mas uma análise mais crítica dessas especificidades, demonstra que a nova preocupação é dar significado a todo esse trabalho, criando conexões com os consumidores. É aqui que um novo componente surge para aproximar marcas e clientes: a arquitetura emocional.
“A arquitetura dos espaços tem um impacto muito forte na forma como nos comportamos e nos sentimos. Priorizar as pessoas, pensar nas experiências e nas sensações que elas possam sentir nos ambientes vai muito além do aspecto visual”, conta Juliana Medeiros, arquiteta e especialista no tema.
A profissional ressalta que essa abordagem em pontos comerciais, feiras e ações envolvendo as marcas, visa, de fato, uma ação mais humana. “A arquitetura emocional busca entender as necessidades e proporcionar interação, conexão e despertar sentimentos. Buscamos materializar sensações, bem-estar e criar espaços com significados”, acrescenta.
Juliana destaca ainda que a proposta dos espaços está sempre alinhada ao discurso de cada marca. “Isso permite criar contexto, relevância e novas possibilidades de conexão e negócios”. “O cliente que se alinha ao discurso de uma marca, produto ou serviço tende a compartilhar suas experiências com outras pessoas”.
Bate-papo com Juliana Medeiros
A arquitetura emocional é mais do que um arranjo inteligente de tijolos. Isso fica claro na conversa com Juliana Medeiros, onde ela demonstra como pensa seus projetos e quais fatores considera. “Gosto de estudar a forma como as pessoas interagem e observam os espaços. Para isso, considero essencial viajar e sentir culturas diferentes. É importante respirar outras conexões para criar”.
Sobre suas referências atuais, a profissional destaca a produção de estúdios de arquitetura escandinavos e japoneses. “Eles chamam minha atenção pela simplicidade, sensibilidade e pureza nas soluções. A atenção ao essencial é importante para criar envolvimento”.
Abaixo, nas fotos, projeto de arquitetura e interiores para a loja God Save the Beer – Cervejas Especiais, em Curitiba (PR).
Como passar emoção para um projeto de arquitetura comercial e corporativa?
Assim como as pessoas, as marcas têm suas essências e seus propósitos. Precisamos compreender isso junto à equipe antes de definir o projeto. Hoje, mais do que produtos, a busca é por experiências e precisamos desenhá-las de forma encantadora. De nada adianta uma experiência interessante e um ambiente esteticamente lindo se isso não estiver alinhado com o que a marca acredita, em sintonia com a linguagem e essência dela. É preciso compreender essa “verdade” em cada marca. Com isso, conseguimos estudar diversos fatores que permitem traduzi-la em espaço, de forma que possa ser percebida. E, mais importante, que possa ser sentida.
Mas como isso se alinha de forma prática?
Cada projeto tem o seu caminho, mas o primeiro passo é desenhar a jornada de contato com a marca. Há sempre uma combinação perfeita dos materiais, para que façam sentido. Cores, iluminação e elementos simbólicos também podem passar significado e gerar essa conexão com o universo da marca. Por vezes, não precisamos de muitos fatores para passar o recado. Um elemento ou aspecto único estrategicamente bem pensado já faz surtir o efeito desejado. O importante é ser genuíno, pois isso acaba reverberando e atingindo o subconsciente das pessoas.
Na sequência de fotos, projeto realizado para o bar We are Bastards. Espaço mescla entretenimento, música, cervejas artesanais, drinks, comida, café e loja.
Cada marca está inserida dentro de um contexto, evento ou necessidade, e não há uma receita a ser seguida. É preciso analisar cada marca isoladamente.
Como a arquitetura emocional se encaixa na ideia de que marcas precisam contar histórias?
Os consumidores são muito mais conscientes e buscam marcas com as quais se identificam. Contar histórias gera conexão e engajamento, quando são verdadeiras. Com a arquitetura, precisamos ir além do discurso e da história bem contada, e transformá-la em uma história que possa ser vivenciada e sentida pelas pessoas. Isso proporciona experiências únicas, que geram conexão mais clara e engajamento mais profundo entre marca e pessoas.
Oscilamos de humor conforme os acontecimentos. Mas é possível garantir que um projeto de arquitetura emocional engaje todos os públicos?
As pessoas podem até perceber os espaços de formas semelhantes, no sentido visual, mas o “sentir” é muito particular. Mesmo o foco sendo em proporcionar uma atmosfera do universo da marca, cada cliente apresenta seu repertório de vida. Nossas experiências, memórias e associações acabam levando a uma percepção única do espaço. Os níveis de engajamento e o que de fato podem chamar a atenção é algo que até podemos supor, mas esse retorno quase sempre nos surpreende. É aí que está todo o encanto.
Abaixo, stand Essências para a Arauco do Brasil, na feira ForMóbile 2016.
Arquitetura emocional
Como a escolha do mobiliário e da iluminação interferem nesse processo?
A iluminação é uma questão essencial em cada projeto. Quantidade, temperatura e localização podem transformar a sensação que se tem em um mesmo espaço. Para atingirmos a atmosfera que queremos, muitas vezes, acabamos desenhando luminárias exclusivas para o projeto. Sempre com um olhar muito atento a temperatura de cor que podemos alcançar.
A escolha do mobiliário também passa muito sobre a personalidade do local. É um dos pontos fortes de contato visual, que podem transmitir a alma do espaço. Muitas vezes ele não é percebido conscientemente, mas a escolha dessas peças diz muito. Um mesmo modelo de cadeira, a combinação de peças diferentes ou um mix de cores podem passar sensações completamente diferentes em um mesmo espaço. Mas é essencial não fugir do conceito estudado para o ambiente. Caso contrário, podemos perder boa parte da atmosfera que queríamos passar.
No final, é o equilíbrio nessa combinação de escolhas, entre outros fatores, que irão interferir na percepção da arquitetura.
Três fatores são importantes no processo criativo de um projeto de arquitetura emocional: verdade, experiência e amor.
Acima, instalação In.side criada para a Arauco do Brasil durante a feira Expo Revestir 2017.
Em tempos de digitalização, o sensorial ganha relevância nos ambientes. Como isso se conecta na arquitetura?
Estamos em constante mudanças. Vivemos no meio de uma infinidade de informações e novidades, mas as pessoas não querem apenas ver algo novo, precisam se encantar. Para muito, os smartphones parecem fazer parte do corpo. Antes mesmo de sentir o espaço, as pessoas já compartilharam a foto do que acabaram de ver.
Este é um grande desafio. Fazer com que esse momento do sentir se torne mais longo e vire uma experiência. Que ele seja de tamanho impacto e empolgação, que faça com que as pessoas adiem a ideia de levantar a câmera do celular. Que eles desejem vivenciar e estar presente naquele espaço.
Acredito que podemos olhar para tudo isso de uma outra maneira e buscar ações que estimulem mais sentimentos, boas sensações e melhores relações interpessoais. Por isso, nos projetos, buscamos aspectos sensoriais, mantendo eles em equilíbrio, estimulando a interação nos espaços e deixando as pessoas mais próximas umas das outras. Vejo a arquitetura e o design como uma forma de pensar novas soluções. Transformações na forma de viver e interagir com os espaços podem, sim, criar uma melhor relação entre as pessoas.
Instalações pop-up e stands podem gerar relacionamentos duradouros para as marcas?
Um espaço temporário envolve uma estratégia ainda mais clara e objetiva. Sabemos que esse projeto não existirá daquela forma e naquele contexto nunca mais. Portanto, será uma oportunidade única. Esses espaços terão curta duração, muitas vezes poucos dias, e não há tempo para ajustes. Tudo tem que funcionar e precisa ser relevante. Ou seja, precisamos passar o recado da marca e gerar impacto em um curto espaço de tempo.
No caso das grandes feiras, com muitos outros stands a visitar, é necessário pensar não só na forma como as pessoas sentirão a mensagem da marca, mas no tempo que ela terá para perceber isso. O processo é bem diferente de um estabelecimento permanente. Mas com a estratégia do espaço bem alinhada, podemos proporcionar vivencias de impacto, que geram vínculo e conexões mais profundas com a marca. Isso certamente permanecerá na memória das pessoas.